André Rebouças

Cannes, 13 de maio de 1892
Meu mestre e meu Imperador. – Não passará o terceiro aniversário da Libertação da Raça Africana no Brasil sem que André Rebouças dê novo testemunho de filial gratidão ao Mártir sublime da Abolição.
Sinto-me feliz por ter sido escolhido pelo Bom Deus para representar a devotação da Raça Africana a Vossa Majestade Imperial e à Princesa Redentora, e alegro-me repetindo-o incessantemente.
É hoje grato relembrar a síntese da nossa vida, como meu Bom Mestre disse no Alagoas quando comemoramos seu 64º aniversário.
Participou em Petrópolis, em 1850, há quarenta e um anos, examinando-me em aritmética, ainda menino de colégio, e continuou, quase quotidianamente, nas lições e nos exames das Escolas Militar, Central e de Aplicação na fortaleza da Praia Vermelha, até dezembro de 1860.
Os anos de 1861 e 1862 foram de estudos práticos de caminho de ferro e de portos de mar na Europa. A primeira Memória, escrita com o Antônio, datada de Marselha, em 9 de junho de 1861, foi dedicada, como de justiça, ao nosso Bom Mestre e Imperador. Quando Vossa Majestade encontrava meu Pai, suas palavras primeiras eram: – Como vão os meninos? – Onde estão agora? Recomende-lhes sempre que estudem e que trabalhem.
Voltamos ao Brasil em fins de 1862, e encetamos a vida prática nos trabalhos militares de Santa Catarina, motivados pelo conflito Christie.
A 28 de dezembro de 1863 separei-me, pela primeira vez, do meu irmão Antônio… Começa daí em diante o período industrial de minha vida…
Vossa Majestade e meu Pai não queriam que eu tivesse uma orientação além da vida tranqüila da Ciência e do Professorado; mas o visconde de Itaboraí, que também me devotava afeição paternal, dizia: – André!… Quero que você suceda ao Mauá!…
Sabe Vossa Majestade quanto sofri da oligarquia politicante e da plutocracia escravocrata nesses afanosos tempos… Só tenho hoje deles uma consolação: – Projetei e construí as Docas de Pedro II; concebi e dirigi o caminho de Ferro Conde d’Eu e sua bela estação marítima de Cabedelo.
Vossa Majestade gosta de recordar que, em Uruguaiana, salvamos juntos, pelo nosso horror ao sangue, 7.000 mil paraguaios e centenas de brasileiros… Na atual antipatia ao militarismo, apenas me lembro dos trabalhos de Itapiru e Tuiuti.
Em 1880 começa a Propaganda Abolicionista. Nós, tribunos ardentes, só tínhamos uma certeza e uma esperança: o Imperador. Em 1871 havia Vossa Majestade concedido à Filha Predileta libertar o berço dos cativos com Paranhos, visconde do Rio Branco.
Em 1888 a iniciativa partiu d’Aquela que não pode ver lágrimas nem ouvir soluços de pobres, de infelizes e de escravos, no amor Santo de Mártir do Cristianismo Inicial, aspirando menos à glória na Terra do que anelando a benemerência no Céu, junto a Jesus, o Redentor dos Redendores.
Enfim… Creio que podemos esperar tranqüilos o juízo de Deus; porque havemos cumprido sua grande Lei trabalhando pelo Progresso da Humanidade.
Agora, só tenho a dizer-lhe que desde 15 de novembro de 1889 perdi a linha divisória entre meu Pai e meu Mestre e, Imperador, e que é na maior efusão de amor que me assino, – Com todo o coração – André Rebouças.
(Nabuco, Joaquim – MINHA FORMAÇÃO – pgs. 173-174)
Share

Comentários

Postagens mais visitadas